Artigo: Uma análise crítica sobre as queimadas na Amazônia

Por Renata Franco*

Há muito se alardeia sobre o desmatamento na Amazônia. Ano após ano, notícias relatam o maior desmatamento no período e o alerta de que a Floresta Amazônica se aproxima de um estágio de perda da resiliência, ou seja, perda da capacidade de se recuperar diante dos danos sofridos, mais rápido do que o previsto.

 

Recentemente, o Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe) indicou que o desmatamento na Amazônia Legal foi de 291 km², em fevereiro. A Amazônia Legal corresponde a 59% do território do país, englobando a área total dos seguintes estados: Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins e parte do Maranhão; esse desmatamento seria o maior nível, para o mês, em toda a série histórica em que a instituição fez as medições.

 

Ocorre que essa é uma realidade vivenciada há muito tempo.

Em que pese a concepção e a percepção sejam mais recentes, as questões ambientais que se manifestam no Brasil desde o seu descobrimento refletem na construção do pensamento social brasileiro.

 

A história brasileira de exploração como Brasil colônia e degradação ambiental de alguns desastres ambientais como a tragédia da Vila Socó em Cubatão (SP), o caso do Césio 137 de Goiânia (GO) e o desmatamento desenfreado da Amazônia e da Mata Atlântica contribuíram e muito para a realidade do ordenamento jurídico pátrio.

 

Tanto que a Lei de Crimes Ambientais foi votada em caráter de urgência, em fevereiro de 1998, em virtude dos altos índices de desmatamento na Amazônia (21.050 Km² em 1998)[1] e à pressão internacional para que o Governo Brasileiro adotasse medidas eficientes para o seu combate.

 

Tal votação foi motivada pela publicação do Primeiro Relatório Nacional para a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) que apresentava dados sobre o desflorestamento na Amazônia, de acordo com informações do IBAMA e do INPE, apontando, à época, como principal causa a conversão da floresta para produção de pastagens e lavouras temporárias.

 

No entanto os índices mais alarmantes de desmatamento ocorreram, principalmente nos anos de 1988 e 1995, muito embora em todo o período tenham-se mantido elevados.

 

Apesar das inúmeras discussões sobre a Lei de Crimes de Ambientais, em que sua aprovação foi um “cala boca” àqueles que reivindicavam a internacionalização da Amazônia sob o pretexto da total ineficiência do Governo Nacional, observa-se que seu êxito foi relativo: o desmatamento reduziu em praticamente 50%, mas em 2022 ainda era de 11.568 Km²[2]. Além disso, a pressão internacional continua grande sobre a soberania nacional de nossa floresta.

 

A questão é de política pública, fiscalização, conscientização e gestão do território. O Brasil possui um sistema legislativo robusto, mas um processo de gestão e aplicação de políticas públicas não tão efetivo: seja pela falta de aparelhamento dos órgãos, seja pela falta de pessoal, seja pela ausência de fiscalização, ou melhor, multifatorial. Política pública não se muda com governo, é algo que para se ter sucesso, deve ser perene.

 

A solução não é simples, mas deve ser enfrentada! E a contradição na relação entre desenvolvimento e meio ambiente – como crescer economicamente sem afetar o estoque de riquezas naturais existentes no planeta, deve ser superada com o equilíbrio dos meios de produção e, enquanto não se evolui o pensamento social voltado para esse equilíbrio, o estado precisa fazer as suas vezes, como órgão de gestão e fiscalização de forma efetiva!

* DRA. RENATA FRANCO

Diplomada em Estudos Aprofundados (D.E.A.) em Science du Travail et de la Formation pela Université de Metz (França), com um estudo comparado da qualidade ambiental, planejamento urbano e políticas públicas, entre as cidades de Campinas(SP) e Metz (França).

Recebeu o título de Doutora em Ciências Sociais na área de Transformações Sociais e Políticas Públicas nas Sociedades Contemporâneas pela UNICAMP com a reflexão sobre a efetividade da proteção ambiental no Brasil, com uma análise sobre a lei de crimes ambientais e as decisões proferidas pelo STF.

É graduada em Direito pela Universidade São Francisco e em Ciências Sociais pela UNICAMP, com especialização em Direito Público pela Escola Paulista da Magistratura e Gestão Ambiental pela UNICAMP, com extensão em Direito Ambiental pelo Instituto Brasileiro de Advocacia Pública – IBAP e Direito Internacional Público pela Academia de Direito Internacional de Haia (Holanda).

Atua como professora dos cursos de graduação e pós-graduação. É membro do Departamento de Meio Ambiente da CIESP Campinas e da Câmara de Comércio Americana (Amcham). Foi consultora da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará (2009-2010), para elaboração e revisão das normas ambientais e de recursos hídricos para o Estado.

Atualmente é presidente da Comissão de Meio Ambiente da OAB/Campinas e membro do FUNDIF, CONGEAPA e CONDEMA, do Fundo de Pagamento por Serviços Ambientais e da APA Campo Grande.

 

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